terça-feira, 30 de novembro de 2010

Entre as flores e as dores


Ontem, fim de tarde, quando eu saía pra universidade, pra trabalhar, me encontrei, e também me despedi, do jardineiro que chegava em casa para a poda do mês.
Só hoje cedo vi que ele cortou por completo uma trepadeira, chamada jasmim-estrela, linda, que fechava, cobria, todo o pergolado de uma das garagens de casa.
A trepadeira, que derrubava com ela belíssimas flores brancas de cinco pontas, se foi, deixando o ambiente mais claro, menos aconchegante.
Questionei minha mãe sobre o corte da planta, e ela me contou que a trepadeira estava sufocando, matando, se já não tinha matado, a outra trepadeira vizinha, chamada de sapatinho-de-judia, que é um desenho da natureza, que ganha muitos elogios e fotografias quando floresce.
Fiquei pensando que era uma pena. A trepadeira cortada havia criado um ambiente lindíssimo, de muito verde, mas não soube conviver com a outra planta sem atrapalhá-la.
Durante estes últimos dias, enquanto via a ação policial no Rio de Janeiro, fiquei imaginando o tempo que durou o sofrimento das famílias inocentes rendidas ao monopólio dos criminosos.
Por meio de algumas entrevistas, entendi o quanto o tráfico significava leis e regimentos para aquelas comunidades, leis fora da lei comum, leis criadas na humanidade de um grupo desumano.
Foram décadas de exploração, de medo, de incertezas, tudo porque a natureza parece exigir, para o funcionamento de tudo, a hierarquia, o domínio, o comando.
Fico pensando nas linhas tênues que delimitam o respeito ao espaço, aos direitos, ao corpo, à alma, à integridade e à dignidade, e penso que é mesmo difícil pensar em tudo isso quando até a natureza parece exceder seu espaço e invadir e sufocar, se for preciso.
A verdade é que, em algum momento, quando o abuso se torna insuportável, quando a última gota enche o copo, o excedente precisa, e é cortado de vez, pra que o oprimido respire novamente, se ainda não tiver desfalecido.
Tocada pelo que ando vendo na TV, me felicito imensamente, talvez porque sinta que existe uma esperança de aquelas pessoas inocentes, daquelas crianças que já viram a criminalidade e o medo de tão perto, respirarem novamente, aliviadas, tranquilas.
Quanto ao sapatinho-de-judia, que também floresça aliviado. Que agora, sem o lindo jasmim-estrela de flores brancas, tão lindo, tão asfixiante, a planta que fica, floresça ainda mais.

5 comentários:

  1. Com tantas comparações e analogias feitas sobre os recentes acontecimentos no Rio, não vi nem um que pelo menos se aproximasse da Botânica... rsrsrs

    Falando sério, brinquei sobre a botânica e tal, mas foi uma ótima comparação. Ficou muito legal a sua idéia de sufocamento das pessoas que vivem nas favelas por parte dos bandidos. Acredito que é um sentimento muito bem adequado à situação, de ótima sensibilidade.

    *Sua visita ao meu blog me deixa honrado. Assim nós nos conhecemos, “blogamente” falando, e poderemos trocar muitas idéias.

    Até mais.

    ##

    ResponderExcluir
  2. Seu texto é mesmo a única analogia feita sobre o assunto.
    Com grande sensibilidade, inteligência e incrível bom gosto!

    ResponderExcluir
  3. Obrigada, queridos.
    É muito bom saber que alguém está atento ao que dizemos nas linhas, e, sobretudo, nas entrelinhas.

    ResponderExcluir
  4. Andreia
    Muito obrigada por visitar e comentar no meu blog e tb pelo link.Constato que tb gosta de poesia e do trabalho do Francisco José Viegas ,meu ex colega do Circulo de Leitores e da Revista LER
    Abraço
    anA

    ResponderExcluir
  5. *Querida ANDRÉIA !!! *
    * Vim aqui para TE

    AGRADECER a tua amizade para

    comigo nesta LINDA *Blogosfera e

    para TE DESEJAR um ano de *2011

    com SAÚDE e SUCESSO em todos os

    teus empreendimentos + momentos

    de PURA ALEGRIA ao lado de todos

    os teus entes queridos !!!

    *Fiques com Deus.

    *Abraço forte.

    ResponderExcluir