terça-feira, 22 de junho de 2010

Técnicas de lavoura


Só depois de uma certa idade, não tão avançada, é que descobri que meu avô materno era na verdade padrasto de minha mãe. Soube que ele havia se casado com minha avó pouca coisa antes de meu nascimento.

Fiquei surpresa. A afeição e o cuidado dele para comigo e minha família sempre foram tão grandes, tão desmedidos, que à partir de minha descoberta, passei a admirá-lo ainda mais.
Meu avô sempre gostou de plantio. Plantou sempre, plantou muito. A horta do quintal da casa de minha avó era engenhosamente arquitetada para o melhor aproveitamento do sol, e o sistema de irrigação era invenção puramente dele, misturando reciclagem e muita experiência.
Aprendendo a ler e a escrever tarde, meu avô anotava dicas sobre lavoura que ouvia e via na TV. Cuidadosamente anotadas num caderno brochura pequeno, as dicas eram passadas para mim, que corrigia a grafia das palavras escritas por ele com tanto afinco.
Meu avô não aprendeu a grafia perfeita, e nem eu aprendi a ser lavradora. Sou professora.
Meu avô mudou de terras depois que minha avó se foi, mas ainda planta.
Se eu pudesse voltar no tempo, não o teria corrigido. Hoje vejo que saber a grafia perfeita é tão útil quanto saber falar grego. Hoje sei que ter o dom de germinar vida é imensamente mais honorável. Me sinto completamente orgulhosa porque meu avô planta.
Ela ainda planta as mesmas plantas, rega as mesmas folhas, colhe com cuidado, irriga a terra, deixando-a úmida e fértil, e depois torna a plantar.
Entre outras coisas, ele plantou sabedoria, afeição, plantou cuidado e, em especial, planta, ainda, saudades de um tempo no qual tínhamos tempo para ver juntos as folhas e flores se abrirem lentamente e lindamente, no quintal da casa de minha avó.

Um comentário:

  1. Todos somos professores durante a nossa vida.Uns com carteira profissional, outros amadores, mas formadores sempre. Abraço e obrigada.
    anA

    ResponderExcluir