quinta-feira, 4 de abril de 2013

Vitrine de mim


Algumas crônicas nascem quando estamos tristes, e confesso que prefiro as que brotam de momentos felizes.
Desta vez, porém, mesmo depois de tanto tempo sem escrever, sou obrigada a aceitar que São Paulo tenha me trazido uma crônica abarrotada de tristeza, ou quem sabe eu tenha me aberto a ela.
Querendo me distrair, já que tinha toda uma tarde paulistana pela frente, eu, sozinha, achei que passear por entre as vitrines da Rua João Cachoeira, perto de onde me hospedo com frequência, seria uma boa opção.
Enquanto entrava e saía de lojas, experimentando vestidos, escolhendo saias, paquerando de tudo um pouco, resolvi entrar em uma loja de aparência simples, e perguntar por um belo shorts social que vestia um manequim na vitrine. Uma senhora rapidamente saiu de trás do balcão no fundo da loja e veio em minha direção.
Enquanto ela caminhava, meus olhos precisaram segurar as lágrimas.
Descobri naquela senhora um retrato fiel de minha avó, falecida há treze anos.
Tentando exercer meu autocontrole, achei bom revelar a ela o motivo de meu espanto, antes que minha expressão surpresa pudesse soar algum outro tipo de estranhamento. Quando as lágrimas começaram a cair, porém, deixei a loja antes mesmo de perguntar pelo shorts, do qual eu nem me lembrava mais.
Enquanto andava pela calçada, voltando para casa, decidi deixar as lágrimas nascerem e morrerem sem poupá-las, talvez porque eu sempre as tenha reprimido. Tenho, sim, dores, tenho uma saudade imensa, sofro diariamente, somando o tempo que já se passou sem que eu tenha podido vê-la, e calculando quantos anos ainda terei sem poder ver seus olhos verdes, tão claros, como aquela vitrine, tão iguais aos daquela senhora da loja da Rua João Cachoeira.
Enquanto andava pela calçada, mensurava o quanto eu daria para ter um minuto que fosse com a minha avó uma vez mais, e revelar a ela a diferença que a ausência dela fez na minha historia, na minha trajetória. Ah, se ela soubesse...
 Enquanto andava pela calçada, decidi escrever esta crônica, triste, daquelas que não gosto. Achei que devia revelar, em tom de vitrine, sobre como ainda sofro. Achei que podia e devia contar sobre como uma tarde sozinha pode se tornar uma tarde solitária, cheia de saudades e de sonhos.
E continuei, de vitrine em vitrine, de lágrima em lágrima, de calçada em calçada.

Um comentário:

  1. Andreia, que presente agradável descobrir seu blog, todo ele "em tom de vitrine"!!! Gostei muito do seu jeito de escrever, parabéns e sucesso!

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