segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Mestres e aprendizes...


Temos uma tendência de reclamar, sempre. Alguns, mais pessimistas, dizem que “a tendência é piorar”, outros mais otimistas, acreditam que a bandeira de paz há de se levantar.
A verdade é que reclamamos muito. Do irmão mais novo, do mais velho, de ser filho único, de morar perto, de morar longe.
Quanto a mim, gosto de ser irmã mais velha, e sempre quis um irmão mais novo. Desde que ganhei um, ainda que reclame, tenho meus momentos de êxtase, aqueles momentos nos quais me lembro do quanto é maravilhoso ser uma irmã mais velha.
Lembro-me que logo que tirei carteira de habilitação, sentia prazer em realizar qualquer tarefa que envolvesse a direção.
Tirava o carro da garagem para o meu pai, o guardava quando minha mãe pedia, levava meu irmão pequeno às aulas vespertinas de futebol, e o buscava, em pleno meio do dia, com a fome fazendo um rombo no estômago, na escola. Tudo isso pelo prazer e pela emancipação de conduzir um veículo.
Assumir a direção do carro era um prestígio, um frenesi, uma realização pela qual eu lutara dezoito longos anos.
Num desses dias, enquanto abria o portão automático da garagem para guardar o carro de meu pai, estacionado do lado de fora de casa, meu irmão, sete anos mais novo, correndo mais do que podiam as pernas, chegando ao meu lado, perguntou onde eu ia.
Pensando rápido, brinquei:
- Vou tomar um sorvete, vamos?
Ele se preocupou por não ter um trocado nem para uma bola de sorvete, mas minha generosidade fora maior:
- Eu pago pra você! Entra logo aí no carro.
Ainda me lembro do sorriso de meu irmão, satisfeitíssimo por ganhar uma bola de sorvete, assim, no meio da tarde, fruto de tamanha bondade da irmã mais velha.
E se sentou no banco do passageiro.
Saí com o carro, devagar, deixando o portão aberto. Fiz o balão na esquina de casa, e voltei, guardando o carro na garagem. Eu, segurando o riso, ele, a decepção.
De acordo com o meu irmão, que gosta de contar essa história e ainda ri muito dela, esta foi, e será, a melhor das minhas artes, espontânea e tão bem arquitetada.
Nas palavras dele: - Essa, tenho que admitir, foi de mestre.

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