quinta-feira, 26 de agosto de 2010
Alinhavando lembranças.
Algumas lembranças nos aparecem nos momentos mais inesperados, chegam quando menos aguardamos, como uma fotografia guardada, tirada de uma caixa antiga, quase sumida, trazendo de volta tantos sentimento que andavam, talvez poupados.
Hoje tive um momento tão único que não sei se será possível traduzir. Penso que tenho poucos recursos para descrever o que me passou pela mente, pelo coração, na tarde de hoje.
Massacrada pelo calor das três da tarde, me propus a enfrentar a sauna que é o centro da minha cidade. Precisava pagar algumas contas, levar algo ali e lá para arrumar, desarrumar a conta bancária, gastando mais, e entre tudo isso, precisava passar na costureira, que me prometeu dar jeito nas roupas que há um tempo andam ficando largas na minha silhueta.
Na prova da roupa, na casa da costureira, notei que alguns ajustes ainda eram necessários, e fiquei ali mesmo, a esperar a D. Lurdes, sentada na máquina, a modificar o que não deu certo.
De repente, com as mãos presas ao batente da porta, pondo só o rosto para dentro da sala, uma garota de 12 ou 13 anos esperava, comigo, a avó a terminar o serviço.
Eu vi, me vi, naquele momento. Quantas vezes eu, neta de costureira, como aquela menina, observei minha avó por entre as idas e vindas da agulha, riscando os moldes no jornal, acelerando ou reduzindo o ritmo da música da máquina de costura, vestindo as amigas, as mesmas que ligavam para saber se estavam prontas as roupas, me perguntando:
- É da casa da Dona Giza?
- Da Dona “Ziza”, aham, é. – sempre gostei de tudo muito certo.
A costureira, D. Lurdes, tentava fazer o serviço rápido, certamente imaginando que eu estaria com pressa. A verdade é, porém, que a tarde me foi tão familiar e despertou tantas boas recordações, que congelei o momento, enquanto o som da máquina de costura acelerava meu pensamento, e reduzia, trazendo, entre os cerzidos e arremates, a minha história e de minha avó, de tantas saudades, tão mal arrematada pra mim.
Brinquei com a neta de D. Lurdes, conversei um pouco, perguntei se ela ficava sempre na casa da avó. Ela disse que sim. Eu disse que casa de avó era bom, contei que a minha também tinha sido costureira.
Não contei, porém, que tudo o que eu queria era a máquina de costura de minha avó trabalhando novamente, nos atrapalhando ouvir o som da TV, nos tirando a calma do sono da tarde no quarto que era dos netos.
Não contei que eu desejava a ela, a neta, que ela tivesse ainda muito tempo de vó, de máquina de costura, de linhas, de carretéis, de retalhos, de botões, de moldes, de agulhas, de zíperes, e tudo mais que avós costureiras nos ensinam.
Hoje não sei mais cobrir botões, coisa que eu sabia fazer para a minha avó, e vejo poucas máquinas de costura, já que compro roupas prontas. Mas da minha infância em casa de vó ao som de máquina de costura, disso não me esqueço, sempre me lembrarei.
Que a neta de minha costureira, a Ana, tenha a certeza de que ela viveu hoje, em meio a todo aquele calor fora de época, em plena quinta-feira, às 3 da tarde, um dos mais importantes momentos da sua vida. Ela, a avó, o som da máquina, os retalhos pelo chão, costuraram memórias que ficarão para sempre, como estas minhas, maravilhosas, que retornaram hoje, tão minhas e de minha vó Ziza – não Giza!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Já sabe que eu amei né???
ResponderExcluirMas pena que minhas memórias são falhas e que não lembro tanto quanto você.
Beijo
são momentos transcendentais, parece que a gente se evade do próprio ser,
ResponderExcluirabraço