segunda-feira, 27 de maio de 2013

As mesmas goiabices urgentes de sempre

Ando percebendo que a tecnologia anda - ou corre - em ritmo tão acelerado que às vezes sinto como se tivesse perdido alguma coisa. A forma como algumas coisas são facilmente substituídas, confesso, por vezes me assustam.
Na semana passada, uma colega me contou que bem naquele dia era extinto o MSN, bate-papo famoso de anos atrás. Achei dó. Não que eu usasse. Não uso e não sinto falta. Mas fiquei com pena de que ele fosse mais uma coisa da minha geração a entrar em extinção.
A verdade é que o MSN já chegou extinguindo o ICQ, que cresceu comigo e guarda boas histórias na minha memória.
Em uma das madrugadas adolescentes, daquelas em que se dorme às 3 da manhã, pra acordar às 6, - o que garantia um belíssimo aprendizado nas aulas de física, química, entre outras facilidades da vida escolar - bem na madrugada, resolvi que tinha um assunto importantíssimo pra tratar com a Bia, prima, como eu, sempre de plantão quando o assunto era goiabice.
Na época em que celular era coisa de gente de outra dimensão, eu, sabendo que ouvíamos a mesma rádio nas horas vagas, liguei o computador da família, que ficava no meu quarto, e me conectei ao meu ICQ.
Mandei uma mensagem para o ICQ da rádio, e que dizia:
- A Andréia, cidade tal, pede tal música, e aproveita para pedir à sua prima Bia, que com certeza está ouvindo a rádio também, entrar com urgência no ICQ.
O radialista a leu, e na voz dele soou a maior das ousadias, cheia de graça. Tudo o que eu precisava, agora, era que a testemunha da ousadia a tivesse ouvido.
Com a certeza de que daria resultado, aguardei até que a plaquinha de notificação me avisasse, acompanhada de um som fino do qual me lembro com clareza até hoje, que a Bia estava por lá.
Em estado de graça, quando ela entrou, rimos, durante horas, testemunhas da engenhosidade e da proporção que tomou a arte.
Ela precisou entrar no quarto dos pais, onde morava o computador. Era luz pra todo lado, som alto, e uma explicação nada convincente, pra poder abrir o ICQ o quanto antes, e falar, com urgência sobre absolutamente nada.
É mesmo uma pena que o ICQ tenha sumido. Outra pena é a ida do MSN. Todas estas partidas estão aí só pra nos mostrar como crescemos rápido demais.
Bia e eu estamos hoje casadas, e agora mandamos mensagens via celular. Além disso, nos certificamos de enviá-las durante o dia, pois dormimos mais cedo, e - muito bem - acompanhadas.
Quanto aos assuntos, o tempo, a idade, o casamento, o horário de dormir, mudaram neles muito pouco. Quanto aos assuntos, continuam as mesmas goiabices urgentes de sempre.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Tendências - e pendências - modernas


Preciso confessar que adoro fazer parte das modernidades adolescentes. Ainda que tenha alguma – vaga – noção de que passei de fase, me sinto extremamente à vontade com elas, talvez porque me permitam voltar exatamente pra onde pertenço: para as imaturidades que insistem em morar mesmo que eu cresça.
Em um desses dias, a Polyanna – filha postiça - me apresentou o StarMaker, aplicativo de celular que simula um karaokê elaboradíssimo, que além de orientar o cantor – ou o que pensa que é - com a letra da música, orienta também o tom e as oscilações da voz do cantor original. Ganha ponto quem fizer bonito.
Na tentativa de convencê-la sobre meu autocontrole, embora ela saiba bem da verdade, cantei apenas duas ou três músicas, mas o fato é que estou in love com o danado, e pretendo continuar exercitando meus dotes musicais.
Tudo isso para contar que em uma dessas tardes encontrei uma colega que vejo com frequência. Apavorada, ela me contava que o paquera não responde as mensagens enviadas por ela via celular. Estaria o celular dele desligado? Fora de área? Estaria o coitado do moço sem crédito pra responder? Estaria ele não as recebendo, já que a VIVO tem andado MORTA?
Sofri para orientar minha colega. Passei apertado tentando falar sobre esta arte de saber ao certo quem deve ligar, quem não deve, que, de fato, não domino: Se um liga, acua o outro, se não liga, está desprezando. Se preferir não ligar, e optar pela mensagem, pode parecer descomprometido demais, mas pode também ser um modo sutil de chegar. Ficar sem atender o mocinho pode ajudar a valorizar, mas se ele for dos impacientes, logo desiste.
Quando pensei em sugerir à minha colega ligar e verificar se o bendito telefone andava funcionando, desisti, e pensei em orientá-la a usar o celular para outras coisas, como cantar no StarMaker, que não dá cano, que sempre te aprova ou reprova no ato, com nota e tudo, sem ficar com chove não molha. Mas não orientei.
Dado o adiantado da hora, me despedi com poucas palavras. Não tive chance e nem tempo de falar mais do que eu saberia dizer sobre estas relações diferentes, desenvolvidas por meio de textos de caracteres contados, quando por trás das curtas frases existe tanta coisa querendo ser dita.
Diante do adiantado da hora, me despedi. É que eu tinha baixado uma música no karaokê e estava, assim, doida pra chegar em casa e soltar a voz!

domingo, 19 de maio de 2013

A história teve começo...


Há alguns dias eu conversava com uma amiga querida sobre como algumas crônicas surgem de um pequeno momento, nascem e crescem fáceis, se enfiando por todo o canto da cabeça e do papel igual trepadeira, enquanto outras, em estilo orquídea, delicadas, precisam ser paulatinamente regadas, alimentadas, precisam de silêncio e de paciência, mas brotam. Brotam e podem dar conta de tudo o que andava guardado pelos espaços da mente de quem escreve.
Essa crônica, a de hoje, é uma dessas. Morou na minha cabeça por quase um mês, e confesso que virou rascunho no papel, celular, computador, e, apagada e remodelada, se materializou quando finalmente me encontrei com o Pi.
Num dia desses, assisti ao premiado filme As Aventuras de Pi. O menino náufrago, sozinho no mundo, passa o filme lutando pela própria vida num mar desértico, confiando e agradecendo sua sobrevivência, diariamente, ao propósito Divino. O filme é lindo, sofrido, lição de vida, mas teve, pra mim, um pouco mais.
Acontece que este filme veio em busca da crônica que andava morando na minha mente, a crônica que queria se expressar sobre a partida do João, filho da minha amiga de faculdade, e que lutou como um náufrago num dos mares mais revoltos.
Assim como o Pi, o João conquistou o seu lugar, aprendendo a guerrear com as maiores adversidades que encontrou pela frente, sendo forte, tendo um alvo, e entendendo nas ondas tempestuosas o desafio de permanecer e vencer, pela mãe, pelo pai.
 Pi chegou à terra firme seguro e salvo, mas o João Gabriel perdeu a batalha. Não por cansaço, nunca por desânimo, em nenhum momento por renunciar, mas porque o mar não deu trégua, o mar simplesmente decidiu não se amansar.
As aventuras de João Gabriel entram agora para uma das maiores sagas de coragem das quais possamos nos lembrar. Como um náufrago desbravador, como um menino corajoso, o João se tornou história de vida a ser lembrada, a ser contada, a ser entendida como a história da chegada e da partida de um verdadeiro herói.
E quando o João chegou à terra firme, - sim, o João, - de grandes árvores de copas verdes, deixando o mar, sem nem mesmo olhar para trás, escreveu na areia molhada seu nome, entendendo que chegara ali para ficar, e, assim, ganhando a tranquilidade que há muito não tinha. E, como a história de Pi, a história do João não teve fim. Teve começo.