Me encontrei com Vivina de Assis Viana na segunda-feira dessa semana que se passou. Estar com Vivina é sempre um pedaço novo da vida que nasce. Aprendi muito, como sempre aprendo. Me enchi de novas perspectivas, pessoais e no âmbito de meu trabalho.
Pensei em postar uma outra crônica dela aqui, mas de alguma maneira, sem saber por que, bati o olho nessa e escolhi, sem pensar.
O relógio da matriz
Ontem fez um ano que meu pai morreu. No instante em que ele parou definitivamente de respirar, o relógio da matriz bateu três horas.
Não me lembro, no corredor do hospital, qual dos meus dois irmãos me juntou, num abraço só, a uma de minhas duas irmãs. Nosso primeiro gesto de orfandade.
Não me lembro, depois, quem transportou meu pai para a casa pequena, com quintal grande, onde ele vivera o único ano de sua vida fora de uma fazenda. Único e último, enquanto esperava que sua casa grande, com quintal sem fim, fosse reformada.
Não me lembro do velório começando, se organizando. Algumas cenas, perdidas aqui e ali, mais nada. Uma almofada trazida para que minha mãe descansasse os pés, meu tio Job chegando com algumas orquídeas de seu jardim, um de meus filhos perguntando se eu não ia chorar, o outro brincando na esquina da Prefeitura, amigos chegando, chegando.
Entretanto lembro-me, como se fosse hoje, das três badaladas do relógio da matriz. Um ano depois, ainda posso ouvi-las.
Naquele momento, pensei que meu pai deveria ter ficado um pouco mais. Nem que fosse para ouvir, mais uma vez, aquelas três badaladas. Tão rápido. Uma, duas, três.
Hoje, sei que não. Fascinado por relógios, ele se foi na hora certa, já impossibilitado de ouvi-los. Também não poderia ver o céu azul daquela tarde quente e calma – sexta-feira – em São Tiago.
Quem sabe, ele tenha cuidado de tudo? Que nada faltasse à família. Nem paisagem. Nem calor. Nem mesmo um relógio. Andando, funcionando, batendo. Lembrando que é no compasso e na seqüência das horas que se continua. Uma, duas, três.
Vivina de Assis Viana
Ontem fez um ano que meu pai morreu. No instante em que ele parou definitivamente de respirar, o relógio da matriz bateu três horas.
Não me lembro, no corredor do hospital, qual dos meus dois irmãos me juntou, num abraço só, a uma de minhas duas irmãs. Nosso primeiro gesto de orfandade.
Não me lembro, depois, quem transportou meu pai para a casa pequena, com quintal grande, onde ele vivera o único ano de sua vida fora de uma fazenda. Único e último, enquanto esperava que sua casa grande, com quintal sem fim, fosse reformada.
Não me lembro do velório começando, se organizando. Algumas cenas, perdidas aqui e ali, mais nada. Uma almofada trazida para que minha mãe descansasse os pés, meu tio Job chegando com algumas orquídeas de seu jardim, um de meus filhos perguntando se eu não ia chorar, o outro brincando na esquina da Prefeitura, amigos chegando, chegando.
Entretanto lembro-me, como se fosse hoje, das três badaladas do relógio da matriz. Um ano depois, ainda posso ouvi-las.
Naquele momento, pensei que meu pai deveria ter ficado um pouco mais. Nem que fosse para ouvir, mais uma vez, aquelas três badaladas. Tão rápido. Uma, duas, três.
Hoje, sei que não. Fascinado por relógios, ele se foi na hora certa, já impossibilitado de ouvi-los. Também não poderia ver o céu azul daquela tarde quente e calma – sexta-feira – em São Tiago.
Quem sabe, ele tenha cuidado de tudo? Que nada faltasse à família. Nem paisagem. Nem calor. Nem mesmo um relógio. Andando, funcionando, batendo. Lembrando que é no compasso e na seqüência das horas que se continua. Uma, duas, três.
Vivina de Assis Viana
02.04.1990